BENVINDO(A) A UM ESPAÇO DE POSTAGENS SOBRE MITOS GREGOS COM A FINALIDADE DE MOTIVAR VOCÊ A PENSAR SOBRE POSSÍVEIS SIGNIFICADOS EM SUA VIDA.

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O mito do herói

Culturas orientais e ocidentais apresentam muito em comum no que se refere à descrição mitológica ou religiosa da criação do Universo. A presença de ascensão e queda tanto de entidades divinas quanto humanas, percorre a história dessas civilizações.

Só para citar dois exemplos da literatura ocidental, observamos, no cristianismo, a revolta de Lucifer (que significa o que carrega a luz, uma divindade criada pelo Deus supremo) contra Deus; na mitologia grega, já acompanhamos, em nossas leituras, a sequencia de filhos divinos derrubando seus pais para tomarem o seu lugar.

Observaremos, no decorrer de nossos estudos, a hibris, que é o que representa a desobediência, a desmedida nos limites do homem em relação aos deuses olímpicos, e os castigos que se sucedem por causa disso, do mesmo modo como Adão e Eva foram expulsos do paraíso, “castigados” por sua desobediência. Não há uma diferença fundamental entre os crimes humanos apresentados por essas culturas: resumem-se na desobediência do homem, em relação a ordens divinas.

O que intentamos apresentar aqui, será sempre uma análise dessa “desobediência” ou “desmedida” e suas consequências, quer sob o prisma divino, quer sobre a capacidade de o homem seguir seus próprios destinos em busca de sua evolução.

Não é meu intento descortinar senão as questões arquetípicas que envolvem a mitologia grega, mas sabemos que há inúmeros estudos a respeito da simbologia da expulsão do homem do “paraíso” e o que isso representa para a evolução da alma humana como unidade divina. Do mesmo modo, veremos como Édipo, por exemplo, pode se apresentar como o herói do livre arbítrio com a busca de seu caminho de individuação, em vez de o encararmos, apenas, como o herói predestinado à desgraça, como vemos em diversas leituras literárias. Enfim, estas são as questões que intento levantar para nossas discussões, a partir das próximas postagens.

A descoberta do herói em cada um de nós é de suma importância para nossos estudos. E gostaria de aprofundar-me nessa questão, através da transcrição de um texto que li do livro “O despertar do herói interior”, de Carol S. Pearson, páginas 16 e 17: 

As histórias a respeito de heróis são profundas e eternas. Elas ligam os nossos próprios anseios, desgostos e paixões às experiências dos que vieram antes de nós, de modo que podemos aprender algo a respeito da essência do significado de ser humano, e também nos ensinam de que forma estamos ligados aos grandes ciclos dos mundos natural e espiritual. Embora os mitos que podem dar significado a nossas vidas sejam profundamente primitivos e arquetípicos, às vezes nos inspirando terror, eles também têm a capacidade de libertar-nos de modos de vida falsos e fazer com que passemos a ter uma vida de verdade. Se evitarmos o que T.S. Elliot chamou de ‘terror primitivo’, perderemos nossa ligação com a intensidade e o mistério da vida. O encontro da nossa ligação com esses padrões eternos proporciona-nos um senso de significado e importância até mesmo nos nossos momentos mais penosos e alienados, recuperando dessa maneira a dignidade da vida.

O paradoxo da vida moderna é que, ao mesmo tempo que estamos vivendo como nunca se viveu antes e, assim, recriando diariamente o nosso mundo, nossas atividades frequentemente nos parecem infundadas e vazias. Para transcender esse estado, precisamos nos sentir enraizados simultaneamente na história e na eternidade.

É por isso que o mito do herói é tão importante no mundo contemporâneo. Trata-se de um mito imemorial que nos une a pessoas de todas as épocas e lugares. Ele fala em saltar intrepidamente através dos limites do conhecido para enfrentar o desconhecido e ter confiança de que, quando chegar o momento, teremos os recursos necessários para enfrentar nossos dragões, descobrir nossos tesouros e retornar para transformar o reino. Ele também fala em aprendermos a ser verdadeiros com nós mesmos e a viver em harmonia com os outros membros da nossa comunidade. (p. 16)

Nosso mundo apresenta muitos dos sintomas clássicos de um reino devastado: fome, danos ao ambiente natural, dificuldades econômicas, grandes injustiças, desespero e alienação pessoais e a ameaça de guerra e aniquilamento. Nossos “reinos” refletem estados de nossa alma coletiva e não apenas a de nossos líderes. Esta é uma época da história humana em que há grande necessidade de heroísmo. Tal como os heróis de outrora, nós contribuímos para restaurar a vida, a saúde e a fecundidade do reino como um benefício colateral decorrente do fato de termos empreeendido nossa jornada, descoberto o nosso destino e ofertado nossas próprias e singulares dádivas. É como se o mundo fosse um gigantesco quebra-cabeça e cada um de nós que empreeendesse uma jornada retornasse com um de seus pedaços. Coletivamente, à medida que todos vão dando sua contribuição, o reino é transformado. (p.17)

Com esse texto a autora nos incita à construção e à reconstrução. É claro que, olhando ao redor, observando tudo que está acontecendo atualmente no mundo, muitas vezes, nos vemos incapazes de achar que qualquer medida, no momento, pode ser construtiva, diante de nossa “pequenez” individual.

De fato, em palestras e debates, com muita frequência, ouço pessoas me dizerem: “de que adianta eu me esforçar tanto, se o mundo continua cada vez pior? Minha contribuição, extremamente árdua para mim, diante dos esforços que preciso impor, de nada estão valendo para a modificação do que vejo a meu redor, cada vez mais me parecendo descortinar um caminho para o caos irreversível.”

Costumo responder a essas pontuações apenas com esta observação:

 – Se você acha que tudo que você faz de nada serve para contribuir com a melhora do mundo, assim mesmo faça a sua parte. Se acredita que, realmente, não pode contribuir para a salvação de todos, pelo menos, salve a você mesmo.

Mas lembre-se do provérbio oriental: “quando uma borboleta balança suas asas no Oriente, a brisa de seu farfalhar alcança Ocidente”.

Essas postagens tem como finalidade a busca de autoconhecimento. Ela é atemporal, independe das guerras, das intempéries, do tumultuado mundo em que vivemos.

O autoconhecimento é um tesouro tão perene quanto o mito e os arquétipos que o compõem.  A busca interior transcende os tempos, os lugares, as desavenças entre povos e nações, as lutas políticas e as intempéries do corpo e do espírito. Parte das raízes de nossa própria história, como seres humanos, e se estende para mais além de nossa simples compreensão.

Busquemos isso, apesar de tudo que nos cerca, atentos e atentas às possibilidades que estão ao nosso alcance, com nossas mentes humanas e com nossas almas divinas e eternas. 

(Se quiser, deixe seu comentário ou suas questões no link “comentários”, abaixo, logo após a referência bibliográfica – retornos me ajudam a avaliar as postagens. Obrigada)

Referência bibliográfica:

Pearson, Carol S. O despertar do herói interior: a presença dos doze arquétipos nos processo de autodescoberta e de transformação do mundo. São Paulo, Pensamento, 1995

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